Princípios do Direito Penal

17/06/2013 21:21

 

Funções do Direito Penal

 

  ‘’Quanto mais plural for uma sociedade, maior a possibilidade de conflitos entre seus membros, demandando assim, para a convivência pacífica, um maior número de regras a serem obedecidas’’.

 

  Diante de tal perspectiva, a norma jurídica tem fomo finalidade a fixação de modelos de comportamento, munindo-se de sanções para aqueles que desrespeitarem as previsões estabelecidas na nela e causarem conflitos na sociedade.

 

  Doravante, o Direito Penal assume a função de proteger o cidadão contra as condutas desviantes, dentro dos limites fixados pela lei. É ainda, o elemento norteador que convalida o ‘’poder de punir’’ do Estado, pois esse  ao mesmo passo que emana as normas jurídico-penais, também irá aplica-las através de órgãos competentes, numa relação de interdependência.

 

  • ‘’A relação entre Estado e Direito Penal é, portanto, visceral, pois é o Estado do  que se formam as normas jurídico-penais e é o Estado o único detentor do legitimo jus puniendi, ou seja, o mesmo que cria o Direito Penal – através de normas jurídico-penais- é que irá aplica-las, fazendo por órgãos diversos, como o legislativo e o judiciário’.

 

  No que concerne as normas previstas no Direito Penal,  essas possuem tanto o caráter secundário, que consiste aplicar medidas de segurança, como também normas primárias, as quais proíbem o crime aos cidadãos. Desse modo, a função de proteção do Direito Penal não terá meramente uma  figura intimidatória mas sim um aspecto preventivo, visando motivar o cidadão a não praticar delitos.

 

  • A prevenção do Direito Penal é uma prevenção limitada, que permite combinar a necessidade de proteger a sociedade, com as garantias oferecidas pelos princípios limitadores do Direito’’.

 

O bem Jurídico

 

  Explanado sobre a função do Direito Penal para a sociedade, cabe aqui salientar seu objeto de proteção. Diante dos interesses de maior valor ao conjunto social, caberá ao Direito Penal a responsabilidade de proteger esses interesses, denominados de Bens juíridicos.

 

  O bem jurídico é todo interesse vital de uma coletividade, que em determinado momento, passou a necessitar da tutela do sistema jurídico. A liberdade pessoal, o patrimônio do individuo e a privacidade do domicílio são exemplos de bens jurídicos –interesses sociais – que são protegidos pela Constituição e pelas leis penais, concebendo sanções para a transgressão das mesmas.     

 

  Todavia, denota-se que o Direito Penal não tem o dever de proteger todos os bens jurídicos. Será reclamada a proteção jurídico-penal àqueles em que a sociedade julgar como mais importantes – interesses valiosos a convivência social -  de modo que seja o Direito Penal o instrumento de maior eficácia à proteção dos bens.

 

 

Princípios Limitadores do Direito Penal

 

 

Conceito: Os princípios limitadores do Direito Penal estão expressos na Constituição, na forma de garantias individuais.  Tal fator compreende o fato de que uma vez lidando diretamente com a proteção dos bens jurídicos, deverá o legislador penal atuar em conformidade as garantias estabelecidas na Constituição, como  também a própria intervenção estatal, evitando-se assim, o abuso de poder da ordem jurídica perante as relações sociais.

 

  No entanto, os princípios Constitucionais que limitam o Direito Penal, não exercem somente a função limitadora, mas sim uma dupla função, pois se de um lado constituem um limite à intervenção estatal ( função de garantia dos direitos do cidadão), de outro  são instrumentos de justificação dessa intervenção (função legitimadora), motivo pelo qual servem à legitimação quanto à deslegitimação do sistema.

 

Infere-se aqui os princípios limitadores do Direito Penal:

 

 

Princípio da Ofensividade

 

  O princípio da ofensividade consiste a ideia de que não poderá haver crime sem ofensa a um bem jurídico. Compreendido os bens jurídicos a tutela do Direito Penal, considera-se crime toda conduta que revela uma ofensa ou  lesão ao bem jurídico, de modo que a simples manifestação da vontade não deverá ser imputada como delito. - não criminaliza condutas morais.

 

  • ‘’O legislador deve configurar crimes como uma conduta de ofensa a um bem jurídico, de forma que somente possuam relevância penal os fatos que importem lesão ou ao menos o perigo de lesão a um bem jurídico [...] A adoção desse principio impede  ao legislador e ao intérprete qualquer regressão aos modelos reacionários de crime, que imputavam crime a mera manifestação da vontade, ou o mero sintoma de periculosidade do individuo’’.

 

 

Princípio da Legalidade

 

 

  Tal princípio relaciona-se ao contrato social feito pelos indivíduos, que se subordinam a legalidade do ordenamento para conviver em harmonia. Nesse pacto, o Estado deve atuar de acordo com a legalidade da Constituição, em nome da segurança e legitimidade.

 

Posto isso, entende-se  o princípio da legalidade a partir de 4 subprincípios:

 

Crimen Nullun, Nulla Poena Sine Lege Praevia:  Para toda pena, deve existir antes uma lei penal prevista.

 Art. 1 (CF) – Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.

 

Dentro desse princípio, estão estrelados:

 

 

Princípio da anterioridade: Consiste o fato de que para que se possa ser aplicada a um fato, a lei deve estar em plena vigência antes do acontecimento do delito. Desse modo, garante-se a liberdade do cidadão, permitindo que esse conheça previamente as ações proibias por lei e suas respectivas sanções.

 

 

Princípio da irretroatividade. Nenhuma lei deve retroagir, SALVO nas hipóteses que forem benéficas ao réu. - Ex. Quando a ação for descriminalizada em lei, o réu é inocentado.

 

 

Art. 2 (CP) –  Ninguém  pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela e execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que transitada em julgado.

 

 

  Nesse princípio, integram as concepções de retroatividade e ultratividade da lei. A primeira denota que a lei penal mais grave não pode retroagir para alcançar os fatos passados, ou seja, não poderá retroagir para prejudicar o acusado. – É, portanto, dotada de irretroatividade.

 

  Já a lei mais benéfica, - ou ainda, a descriminalização da conduta - poderá retroagir quando favorecer o réu , em detrimento da lei gravosa. - Nesse caso, a lei é dotada não só de retroatividade como também de ultratividade, pois os efeitos da lei benéfica se sobreporão aos efeitos anteriores da lei mais grave.

 

  •    A lei benéfica surge posteriormente a lei mais grave, sendo assim, utilizada de modo a favorecer o réu. Do contrário,  o advento de uma nova lei que seja mais grave à determinado delito, não deverá incidir sobre aquele que cumpre a sanção baseada numa lei menos grave.

 

 

Nullum Crimen Nulla Poena Sine Lege Scripta: Somente poderá criar crimes e penas a lei que for escrita, promulgada de acordo com a Constituição Federal.

 

    Na área do Direito Penal, o costume não cria o crime. Poderá, apenas, e em algumas situações, excluir a ilicitude, bem como diminuir a pena ou a culpabilidade, sob o fenômeno de desuetudo.

 

 

Nullum Crimem Nulla Poena Sine Lege Certa:   É uma exigência do princípio da legalidade que a lei  seja certa e determinada. A lei, pois, deve ter um caráter taxativo, não podendo utilizar-se de expressões contraditórias ou indefinidas. - Ex. O termo gestão fraudulenta difere-se da gestão temerária. 

 

  •   ‘’A lei penal, como qualquer outra, é compreendida através da linguagem. Desse modo, impõe-se ao legislador uma exigência linguística: a utilização de signos linguísticos claros, que possibilitem uma individualização do modelo abstrato de conduta’’.

 

Nullum Crimem Nulla Poena Sine Lege Estricta Relaciona-se a interpretação da lei penal de forma estrita, isto é,  fundamentada nos dizeres da lei. A analogia é proibida no Direito Penal, quando se deseja criar crimes ou prejudicar o réu – tal função seria reservada unicamente à lei, em seu sentido estrito - .

 

  Permite-se a analogia apenas quando for beneficiar o réu. Ex. – Remissão do dia do preso por estudar, revelando uma determinação análoga a remissão por dias de trabalho.

 

  •     A permissão da criação de crimes ou a majoração das penas através da analogia violaria toda e qualquer segurança jurídica almejada pelo Principio da Legalidade, pois permitiria o exercício de arbitrariedades pelo magistrado que, no caso entendesse que se determinada conduta, não prevista pelo legislador como crime, fosse análoga a outra situação com previsão legal, poderia aplicar a pena dessa àquela.

 

         Tal ocorrência violaria, não só a segurança do cidadão – que não teria o a garantia de conhecer previamente as condutas proibitivas – mas também os postulados do Estado Democrático de Direito, que tem o Direito Penal como um limite a sua própria atuação perante o indivíduo’’.

 

 

 

Princípio da Intervenção Mínima

 

     O princípio supracitado parte do reconhecimento do Direito Penal como instrumento de maior coercibilidade, representando a intervenção mais grave e violenta na vida dos indivíduos. Nesse contexto, entende-se que esse não deve ser utilizado a todo momento, mas somente nas situações em que for estritamente necessário para proteger o bem jurídico. - Quanto menor sua aplicação, maior será sua efetividade; Que se puna menos, para punir melhor.

 

  • Deve-se buscar resolver o conflito em sua origem, evitando-se por meio de outros instrumentos a manifestação do delito; A prevenção genuína é aquela que evita os crimes sob medida a longo prazo.

 

Ademais, o principio da intervenção mínima subdivide-se em 3 categorias:

 

Intervenção Fragmentária:  Como já mencionado anteriormente, o Direito Penal não tem a função de proteger TODOS os bens jurídicos. Protege, então, de modo fragmentário, contra algumas hipóteses indispensáveis de tutela jurídico-penal.

 

Ex. - Para os casos de dívidas, o Direito Civil consegue tornar eficaz a sanção imposta. Já para os casos de roubo, que consiste violência,  o mesmo não teria os mesmos efeitos que a sanção penal.  

 

 

Intervenção Subsidiária:  Exprime a ideia de utilizar o Direito Penal causa última a ser utilizada. Se outros instrumentos não forem capazes de solucionar o ocorrido, reclama-se então ao Direito Penal.

 

  • ‘’Uma intervenção penal não está autorizada se o mesmo efeitos puder ser alcançado da mesma forma por meio de uma medida menos incisiva’’.

 

Princípio da Insignificância:  Tal princípio caracteriza a o fato de que o Direito Penal não deve se ocupar com condutas irrelevantes, cuja a lesão ao bem jurídico protegido não demonstre a necessidade da intervenção punitiva do Estado.  Ex. – Furto de pequenas coisas, como uma caixa de leite no supermercado.          

 

Como insignificante, analisa-se :

 

  • Mínima ofensividade da conduta
  • A ausência de periculosidade da ação
  • O grau reduzido de reprovação social do comportamento
  • A inexpressividade da lesão jurídica

 

 

Princípio da Culpabilidade

 

  A culpabilidade significa atribuir a responsabilidade ao autor pelo ato ilícito que realizou. Sob esse prisma, não pode ser responsabilizado o indivíduo que atua sem culpabilidade – exclusão da responsabilidade pelo resultado - , assim como não se pode ultrapassar a medida da culpabilidade, determinando uma pena superior a responsabilização do ato praticado.

 

Pelo princípio da culpabilidade, retrata-se 3 vertentes:

 

Responsabilidade Subjetiva:  Toda ação criminal deve-se fundamentar na responsabilidade subjetiva. Essa consiste a presença do Dolo – intenção de causar resultado - , ou da Culpa – agir de forma negligente a causar o resultado - na relação entre o agente e o dano causado.

 

Ex. - Construção de uma casa acarreta seu desmoronamento. Nesse contexto, deve-se analisar : O pedreiro que a construiu foi negligente e não observou as técnicas usuais de construção de casas? Se ele foi negligente, então há responsabilidade penal. Se não foi negligente, o fato é considerado como caso fortuito, não cabendo a responsabilização penal. 

 

  • ‘’Não se pode responsabilizar ninguém de forma objetiva, isto é, unicamente pelo resultado causado, se o autor não lhe deu causa por agir culposa ou dolosamente. Ou seja, somente poderá ser punido aquele que agir de forma reprovável, desrespeitando o ordenamento jurídico, embora pudesse fazê-lo’’.

 

 

Princípio da personalidade da pena:  Ao mesmo tempo em que a culpabilidade é razão de sua aplicação – responsabilizando o agente que praticou a conduta ilícita – é também a culpabilidade uma fator que limita sua ação. Não poderá, assim, receber o agente uma pena que exceda seu grau de culpabilidade, ou ainda que esta incida sobre terceiros. Nesse sentido, a responsabilização penal tem caráter pessoal.

 

Ex.- Não se pode decretar uma pena equivalente a de homicídio, ao agente que praticou um furto.

-  Ainda que o agente seja menor de idade e, considerando isso, pratique a ação de furto,  pena aplicada ao delito não deve incidir sobre seu responsável ( o pai não pode ser preso pelo delito do filho).

 

 

Individualização da pena: o princípio da individualização infere que a pena deve ser aplicada individualmente, mensurando essa de acordo com o caso concreto ( desde que em consonância com o principio da legalidade ; previstas em lei).

 

  • Consiste a individualização, em mensurar a pena de acordo com o caso concreto, adaptando a pena ao condenado ; considerando as características do agente e do delito.

 

 

A individualização da pena ocorre em 3 momentos:

 

 

Legislativo:  Quando o legislador cria a norma, fixando o maior e o menor tempo da pena, já estaria ele individualizando, uma vez possibilitando a distinção de um delito e outro, e suas respectivas sanções; gravidade do delito.

 

Judicial:  O juiz aplica a pena considerando a situação e as condições do réu ( caso concreto).

 

Executivo: Ocorre no momento em que o condenado está cumprimento a sua pena. Ex.- benefícios concedidos a quem tem comportamento exemplar.

 

 

  • O descumprimento dessas 3 fases fere o princípio da culpabilidade.

 

 

 

Princípio da Humanidade

 

 

      Tal princípio impede que o Estado aplique qualquer punição que viole os direitos garantias fundamentais expressas na Constituição, entendida como penas cruéis o u degradantes, causadoras de sofrimento ou humilhações desnecessárias.

      Ações de tortura e maus-tratos, bem como a condições precárias de infraestrutura nos presídios revelam situações que vão contra os princípios defendidos pelo Estado Democrático de Direito, ferindo, sobretudo, o artigo 1 da Constituição : A dignidade da pessoa humana.

 

  • ‘‘O Estado não pode agir, nunca, em desconformidade com a lei, mas sim segui-la estritamente, sob pena de desnaturar-se e perder toda a legitimidade de exigir de seus cidadãos o cumprimento da norma; Deve dar o exemplo’’.

 

    Ademais, ao seguir os princípios fundamentais, conclui-se que o acusado em nenhum momento – mesmo após sua condenação – deve perder sua identidade humana,  perdendo somente os direitos que a sentença determinar, como a restrição de sua liberdade.-  Não virará um objeto do processo .

    ‘’Aqueles que cometem delitos devem ser punidos, mas sempre nos limites constitucionais, respeitando as conquistas alcançadas pela cidadania, até porque já é mais do que sabido que não é a gravidade da pena que impede o cometimento do crime, mas sim a eficácia da punição’’.